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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A Fera: modernização de conto de fadas clássico é pior que maldição de bruxa


Em 1987, a CBS lançou na TV uma versão “atual” de “A Bela e a Fera”, com Linda Hamilton e Ron Pearlman nos papéis principais, onde a donzela era uma promotora durona de Nova York e a natureza nobre do feral Vincent a conquistava. Era uma série interessante e que fez algum sucesso durante suas três temporadas. Aproveitando a moda de releitura dos contos de fadas que assola o cinema, o braço fílmico da CBS resolveu produzir uma nova versão moderna para essa clássica história, voltada para a geração “Crepúsculo”, se baseando no livro homônimo de Alex Flinn. Esta é a gênese da abominação cinematográfica chamada “A Fera”.
Aqui, acompanhamos as desventuras do jovem Kyle (Alex Pettyfer), um vaidoso, rico e popular rapaz de um colégio de elite de Nova York que, após humilhar Kendra (Mary-Kate Olsen), uma garota emo que todos pensam ser uma bruxa, acaba descobrindo que a menina é mesmo uma bruxa. Transformado em uma figura “horrenda”, Kyle tem um ano para fazer com que alguém se apaixone por ele, caso contrário, a maldição será permanente.
Abandonado pelo pai (Peter Krause), Kyle fica sob os cuidados de um tutor cego (Neil Patrick Harris) e uma governanta (Lisagay Hamilton). O rapaz acaba se apaixonando por Lindy (Vanessa Hudgens), uma politizada ex-colega de colégio, passando a adotar o nome de Hunter ao assediar a jovem para que esta não saiba sua verdadeira identidade.
É difícil precisar onde as coisas começaram a dar errado aqui. Mas, vamos nos ater ao básico nesse tipo de filme, que é o romance. O fato é que a história de amor dos dois envolve Kyle basicamente sequestrando Lindy, chantageando o pai da menina para que esta vá morar com ele em sua mansão. Isso já destrói qualquer premissa de romantismo que o longa poderia ter. O que se desenvolve entre os dois não é amor, é Síndrome de Estocolmo!
O casal principal é chato, desinteressante e sem química. Pettyfer simplesmente espera que seu visual (com ou sem maquiagem) faça o trabalho cênico por ele, enquanto Hudgens está tão forçada que mais parece estar em uma peça (ruim) de alguma High School estadunidense, com ambos estando ali claramente apenas pelo pagamento, sem nenhum investimento emocional na história e, francamente, não posso culpá-los.
Os diálogos expositivos são outra coisa que ultrapassam a barreira do aceitável. Exemplos disso são o discurso inicial de Kyle, as cenas do garoto falando com o pai relapso, o momento em que um traficante ameaça Lindy (“Sua filha pelo meu irmão!“), a cena em que a mocinha tem de dizer em alto e bom som o quão gosta de fazer trabalho voluntário em um abrigo depois de vermos a moça fazendo isso… Parece que o roteirista e diretor Daniel Barnz precisa mastigar absolutamente tudo para que o público compreenda o que acontece na trama, subestimando a inteligência da audiência. Só lembrando ao Sr. Barnz a regra de ouro do cinema: Mostre, não diga!
Por falar em mostrar, o visual “fera” de Kyle é fichinha perto de figuras como Marilyn Manson, por exemplo, longe de ser exatamente uma criatura repulsiva. Acho que é a primeira fera punk na história da cultura pop, com direito a scars, tatuagens (inclusive uma dizendo “suck“) e cabelo raspado. E mesmo a bruxa que é humilhada por Kyle no começo da projeção jamais chega a ser “feia” como o roteiro (aparentemente) pedia. E chamar a vaidosíssima Mary-Kate Olsen para o papel de uma garota que apronta o diabo para mostrar que vaidade é algo ruim só pode ter sido uma piada por parte dos produtores.
A única coisa que torna a experiência de assistir “A Fera” menos dolorosa é a presença de Neil Patrick Harris, cujo senso de humor traz alguma luz aos intermináveis 86 minutos desta produção. Atuando como o cego menos convincente do cinema desde Ben Affleck em “Demolidor – O Homem Sem Medo”, Harris deve ter percebido a bomba na qual se enfiou e, em todas as suas cenas, resolve fazer piadas com o filme. E, acredite, Harris teve muito material para trabalhar.
Chutando o público para fora da sala de cinema com dois pequenos epílogos mal costurados dentro da narrativa e absolutamente falsos,  “A Fera” consegue a proeza de tornar os filmes da série “Crepúsculo” mais toleráveis por comparação, estando para aquela franquia como “Os Carrinhos” está para “Carros” .
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Thiago Siqueira é advogado por profissão e cinéfilo por natureza. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.


De Cinema com Rapadura

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